Haitanos hoje, nós amanhã? – artigo de Foster Brown

Do IHU Notícias: “Existem mais de dez vezes mais brasileiros na Bolívia e cinqüenta vezes mais brasileiros no Paraguai do que haitianos aqui. Dentro de fluxos chegando ao Brasil, a diáspora haitiana é ainda pequena”, constata Foster Brown, geoquímico, pesquisador do Woods Hole, professor da Universidade Federal do Acre, cientista do Experimento de Grande Escala Biosfera Atmosfera na Amazonia (LBA) e membro da Iniciativa MAP de Direitos Humanos, em artigo publicado no Blog da Amazônia, 17-01-2012. E continua: “Em comparação, nos primeiros seis meses de 2011, mais de 300 mil portugueses regularizaram os seus passaportes para trabalhar no Brasil, mais de setenta vezes o número de haitianos que chegaram em 2011”. Leia aqui o texto integral do artigo.

Sobre o mesmo tema, leia ainda a entrevista de Rosita Milesi ao IHU, Brasil e os desafios da lei de migrações e a matéria Cólera no Haiti: ONU é alvo de duas queixas, do UOL Notícias, traduzido do Le Monde.

 

“Imigração seletiva” e “drenagem de cérebros”, projeto da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência do Brasil

“A primeira versão do projeto da SAE, elaborada por uma equipe formada por economistas, juristas, demógrafos e sociólogos, deverá sair em dois meses. Os responsáveis admitem que o objetivo é propor o que Paes de Barros [o economista Ricardo Paes de Barros, coordenador] chama de processo de imigração seletiva, que priorize a “drenagem de cérebros”, mas estabeleça limites para os estrangeiros que chegam fugindo da pobreza de seus países”.  Parece que o governo brasileiro abandonou a estratégia de construção de uma política migratória, começada durante o governo Lula, para promover estratégia de atração de mão de obra especializada, a fim de prover necessidades de setores específicos. Órgãos como a Secretaria Nacional de Justiça, a Secretaria de Direitos Humanos, o Ministério do Trabalho e o Conselho Nacional de Imigração não são mencionados como membros da equipe formada na Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República. Leia aqui a reportagem do Jornal O Globo, que repercutiu no mundo inteiro (por exemplo, Brasil busca convertirse en un país de inmigrantes profesionales, no El País, de Madri).

Cólera no Haiti: ONU denunciada à Comissão Interamericana de Direitos Humanos

A Faculdade de Direito de Santa Maria (FADISMA) ofereceu à Comissão Interamericana de Direitos Humanos denúncia contra a Organização das Nações Unidas (ONU) em virtude de sua responsabilidade por atos e omissões com relação à disseminação do cólera no Haiti a partir da base militar da MINUSTAH em Mirebalais. Trata-se de ação humanitária por meio da qual coloca solidariamente seu conhecimento jurídico a serviço dos haitianos e demais povos afetados. A epidemia de cólera que se espalhou pelo país (e para além dele) já vitimou fatalmente mais de 6.600 pessoas e contaminou mais de 500 mil. Isso significa, na prática, que mais de 5% da população do país já foi contaminada por uma doença transportada do estrangeiro por meio de soldados nepaleses a serviço da ONU. Até o momento – e mesmo com todas as comprovações científicas da origem da epidemia – sequer um pedido de desculpas oficial a Organização formulou com relação à introdução (mesmo que não intencional) dessa doença desconhecida no país por aproximadamente cem anos.A denúncia, submetida no âmbito do Sistema Interamericano de proteção aos Direitos Humanos, em 29 páginas, pode ser encontrada  aqui: demanda (em quatro idiomas). No mesmo endereço eletrônico é possível que as comunidades nacional e internacional manifestem seu apoio, ação que tem a importante finalidade de sensibilizar os membros da Comissão para a causa (evitando assim um arquivamento silencioso da questão de saúde mais dramática que um povo das Américas vivencia hoje). As redatoras da demanda foram as Professoras Cristine Zanella e  Maria Carolina Beraldo, solicitam a máxima difusão do documento para discussão e eventual apoio. Lembram que esta é mais uma oportunidade para que o Sistema Interamericano de Direitos Humanos afirme a vigência dos tratados dessa natureza em nosso território. Além disso, a denúncia questiona não a legitimidade ativa da ONU (como já é amplamente reconhecida no mundo jurídico desde o caso Bernadotte) mas, sim a legitimidade passiva da Organização, importante seara de discussão que precisa ganhar espaço no meio jurídico tendo em vista as atribuições que as missões da ONU assumem no mundo contemporâneo. Ademais, discute-se a própria competência da Comissão Interamericana – e, por via de consequência – da Corte Interamericana de Direitos Humanos.

Povos Invisíveis

Povos Invisíveis é um filme documentário que explora e questiona as relações entre os jovens de diferentes povos que circulam pelo bairro do Bom Retiro, centro de São Paulo. Além de explorar essa relação controversa, o filme mostra detalhes e belezas de cada cultura.

Conexión Migrante nº 11

Acaba de ser publicado o novo número do boletim Conexión Migrante, com notícias da V Marcha dos Migrantes, ocorrida domingo passado em São Paulo, além de entrevistas, artigos e informações sobre os direitos dos migrantes. Leia aqui.

Senado da França aprova voto de estrangeiros nas eleições locais

Do UOL Notícias. Paris, 8 dez (EFE).- O Senado da França aprovou nesta quinta-feira o voto dos estrangeiros nas eleições locais, com o apoio da oposição de esquerda e dos ecologistas, em uma sessão na qual os partidos do Governo e da oposição manifestaram suas profundas diferenças sobre a questão. O texto foi aprovado com 173 votos a favor e 166 contra, e deverá voltar a ser examinado pela Assembleia Nacional, mas a aprovação de hoje antecipou as posições dos partidos. Passados 12 anos desde que a Assembleia Nacional aprovou o texto original, depois que a esquerda conseguiu pela primeira vez a maioria no Senado e a menos de seis meses das próximas eleições presidenciais, o debate se desenvolveu em um ambiente de acusações entre partidos. Para defender a postura dos conservadores, o primeiro-ministro francês, François Fillon, abriu a sessão e afirmou que “a nacionalidade francesa e a cidadania são indissociáveis”, ressaltando que outorgar o direito de voto aos estrangeiros não-comunitários “solapa os fundamentos” da República. Fillon, que defendeu “uma nação de integração” em vez de “uma nação mosaico”, perguntou aos senadores se eles acreditavam que o direito de votar representa automaticamente a integração dos estrangeiros. Segundo o primeiro-ministro, o fato de os estrangeiros de países da União Europeia (UE) poderem votar na França tem um caráter recíproco e responde à “emergência de uma cidadania europeia”. O líder do Partido Socialista no Senado, François Rebsamen, atacou o discurso de Fillon e considerou que o primeiro-ministro “põe a sociedade em tensão”. A ecologista Eva Joly declarou ser “fundamental” que cidadãos que não têm nacionalidade francesa, mas que vivem junto aos franceses “há, em alguns casos, 30 anos, que têm filhos franceses, que trabalham e pagam impostos” possam “participar das eleições locais”. Enquanto isso, a ultradireitista Marine Le Pen, cujo partido, a Frente Nacional, não está representado no Senado, se manifestou contra a ampliação do direito de voto aos estrangeiros não-comunitários. Segundo uma pesquisa publicada recentemente pelo instituto demográfico BVA, 61% dos franceses são favoráveis à iniciativa aprovada pelo Senado.

Saúde internacional

O Instituto de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo oferecerá, no primeiro semestre de 2012, a disciplina eletiva de graduação Saúde Internacional, ministrada por Deisy Ventura às terças-feiras, das 13h30 às 17h, na FEA (Cidade Universitária). A disciplina faz parte das atividades do Núcleo de Direito Sanitário da USP, que sedia o projeto multidisciplinar “Direito à saúde e democracia sanitária: pontes para a cidadania”, com a participação de pesquisadores de diversas unidades da USP, além de numerosos parceiros de outras instituições brasileiras e estrangeiras.

Confira aqui o programa, o calendário, o sistema de avaliação e a bibliografia da disciplinaSaúde Internacional. Informações sobre a matrícula podem ser obtidas pelo email do Serviço de Graduação do IRI: <relinter@usp.br>

Imagem: Leonilson, 1957 Fortaleza – 1993 São Paulo – Sem título, 1989      Aquarela e tinta preta sobre papel  32,0 x 24,0 – Reprodução da obra autorizada gratuitamente pela Sociedade Amigos do Projeto Leonilson

Tratamento Especial, por Leonardo Rodarte

Acordo em meio a gritos e barulho de helicópteros. Ainda era madrugada quando a Tropa de Choque da PM pôs em marcha a sua operação de reintegração de posse do prédio ocupado da reitoria da USP. O sol sequer se esboçava no horizonte mas o meu quarto no Conjunto Residencial da USP (CRUSP) já se encontrava completamente iluminado. Ao abrir a janela, me deparo com um helicóptero da PM que, sobrevoando a área próxima aos prédios de moradia universitária, disparava um forte rojão de luz em minha direção. Ainda um pouco desnorteado, localizo outros dois, nesse primeiro momento, para depois descobrir por relatos de outros moradores que, ao total, quatro dessas máquinas haviam sido deslocadas para a operação em curso.

Ao barulho dos helicópteros e das pessoas gritando, logo se somariam os estalos causados por duas bombas de gás lacrimogênio lançadas no principal corredor de ligação entre os blocos de moradia. Uma terceira bomba explodiria minutos depois e uma nova onda de gritos de pavor ecoaria em meio aos moradores em seus apartamentos e aqueles que haviam descido para saber o que estava acontecendo.  Vídeos postados na internet conseguem demonstrar a grande névoa que se alastrou por todo o CRUSP que, junto à escuridão do dia nem amanhecera, impedia a visão e nos contaminavam os olhos.

Eu moro no primeiro andar de um dos blocos e a fumaça já havia invadido o meu apartamento pela janela da sala, permanentemente aberta no verão. Situação ainda pior se observava no térreo de um dos blocos, o que abriga as estudantes mães-solteiras e suas crianças. Cerca de 60 crianças que vivem atualmente nas residências estudantis foram, naquela manhã de terça-feira, despertadas ao som de bombas e helicópteros. O mais alarmante é o fato de que a fumaça lançada pela tropa de choque ao alcançar o meu apartamento no primeiro andar já havia se alastrado pelo térreo, onde moram as crianças.

Ainda um pouco confuso, subo pelas escadas de incêndio ao sexto andar do prédio de onde eu consigo observar o que estava acontecendo: centenas de policias obstruíam todas as saídas de acesso ao CRUSP e, em algumas delas, com a cavalaria. Uma moradora gritava insistentemente “Choque no CRUSP”, na tentativa de acordar os demais moradores, como se todos ali já não estivéssemos despertos. Estávamos cercados.

Como muitos outros, desço ao corredor de ligação entre os blocos e vou em direção à principal saída de acesso à reitoria, próxima ao bandejão central. Alguns estudantes já lá estava e buscavam forçar passagem por entre a tropa de choque quando um dos policiais dispara. Outros dois seguem o seu exemplo e também disparam balas de borracha, não tendo por alvo os estudantes, ao que me pareceu, mas o chão onde demarcavam a linha até onde os moradores podiam chegar. Isso não impediu, no entanto, de que uma moradora fosse atingida nas costas. Nesse instante, um coronel ao fundo ordena aos policiais que parem de atirar. As suas palavras foram “Aqui não! Não reajam, não atirem. Estamos na USP”.

Pelas palavras do coronel pareceria que estávamos tendo um tratamento especial por parte da tropa de choque, que tem por conduta rotineira a repressão pela violência e o desprezo pela vida humana, confirmado pelos altos índices de assassinatos cometidos pelas tropas policiais em serviço no Brasil, dentre os piores do mundo. Mas se esse era o tratamento especial das tropas treinadas em direitos humanos, segundo atestam as autoridades, como justificar as bombas dentro das moradias estudantis atingindo até mesmo crianças, e o cerco que armaram entorno aos prédios impedindo o ir-e-vir livre dos moradores e trabalhadores, os que chegavam para trabalhar no restaurante central e os que, como estudante, cumprem a dupla jornada de trabalho e estudos, e que logo se dirigiriam aos pontos de ônibus?

A questão aqui não é julgar quão benevolentes foram ou não as tropas de choque, pois para nós, moradores, fica patente a violação de muitos dos nossos direitos, enquanto estudantes e moradores, ou mesmo como cidadãos. O ponto com que se preocupar, no meu entender, é como os mesmos policiais podem vir a público dizendo que a operação de reintegração de pose foi pacífica e sem uso de violência quando nossos olhos ainda ardem sob o efeito dos gases que nos atingiram dentro do nossos apartamentos. As pessoas que tossiam, com maior atenção para as crianças, ou os dois moradores do CRUSP detidos junto à operação por tentarem romper o cordão de isolamento imposto pelos policiais na área que corresponderia ao quintal da nossa casa, certamente não podem corroborar com o que dizem as autoridades policiais.

Aceitar que essa foi uma operação “pacífica” da PM, o “aqui não”, nos dizeres dos coronel, nos leva fatalmente a considerar a existência de um outro contexto, onde o atributo “pacífico” não pode ser atribuído nem mesmo pelas forças policias. Um cenário assustador onde impera o “aqui sim” oficial.

Leonardo de Cássio Rodarte é estudante de Relações Internacionais e morador do CRUSP. 

“Racismo compreensivo”, la nouvelle vague française

Foi divulgado hoje o relatório anual da Comissão Nacional Consultiva de Direitos Humanos (CNCDH) da França: A luta contra o racismo, o anti-semitismo e a xenofobia. Baseado numa pesquisa de campo, o relatório lança um novo conceito, o do racismo compreensivo, pelo qual as pessoas entrevistadas não se dizem racistas, mas declaram compreender muito bem porque os outros o são. O relatório traz, entre outros, quatro elementos muito importantes, bem reveladores dos efeitos a médio prazo da exploração populista do tema das migrações: 1) 72% dos entrevistados considera os ciganos um grupo à parte, enquanto 48% assim consideram os árabes e 35% os originários do Maghreb; 2) entre os riscos que afligem os franceses, a insegurança é a preocupação maior dos entrevistados (28%), seguida do terrorismo (26%, o que significa um aumento de 15 pontos percentuais em relação ao ano passado); 3) o Islã é apontado como a principal dificuldade na “gestão da diferença” na França; 4) a banalização do discurso racista é considerada o “fim de uma hipocrisia”. Com a entrada em vigor, ontem, da lei que proíbe algo como “a dissimulação do rosto em lugares públicos”, a França consagra-se, enfim, como privilegiado laboratório de uma espécie extremismo ocidental (DV).

Conexión migrante

 Leia a nova edição do jornal Conexión Migrante , publicada hoje, que traz artigos, entre outros temas, sobre o tráfico de pessoas, o Forum Mundial das Migrações, a política brasileira de migrações e nossa conjuntura política.